Metroid Prime: Agradável risco, mais agradável recompensa


Não há outra forma de começar este texto. Durante os últimos anos, acompanhando de perto as reações dos fãs de Metroid nas redes sociais ao longo dos anúncios em coletivas e transmissões da Nintendo, eu sempre me perguntei por que o desagrado com a falta de anúncio de seu jogo do coração se tornava uma crise histérica e quase infantil por conta dos fãs descontentes com a falta de um jogo de Samus Aran. Com Metroid Dread eu finalmente entendo o porquê. E ouso dizer: estarei junto nas próximas reivindicações… tirando a parte histérica e infantil.

Dread surpreendeu os fãs da franquia ao ser anunciado quase de modo furtivo durante os anúncios da Nintendo ainda na E3 deste ano. Na ocasião, a atmosfera de expectativa rodeava mais a ideia de um remake da aclamada série Metroid Prime do que um outro jogo no estilo clássico que alçou voo para a série. Decisão precisa e acertada da Big N, que optou neste jogo o carro-forte para as vendas do novo modelo do seu console, um Nintendo Switch com tela OLED, que saiu no mesmo dia em que Dread. Como recordamos neste texto, a Nintendo é uma das empresas que mais vêm fortes para as vendas de fim de ano em 2021. Mas vamos ao jogo.

Metroid Dread coloca o jogador, naturalmente, no traje de Samus Aran, e conta o que ocorreu com a caçadora-de-recompensas galática após o jogo Metroid Fusion (2002), lançado para GameBoy Advance. Naquela ocasião, acreditava-se que Samus havia eliminado todo e qualquer vestígio dos parasitas X. Após receber um vídeo de um desses parasitas supostamente vivos é que a trama do novo jogo se desenrola, ao tempo em que Samus vai ao planeta ZDR investigar o que tá rolando e é arrasada por um Chozo — uma raça primordial que construiu o planeta SR-388. Complicado, eu sei, mas dá pra resumir. Basicamente Samus precisa investigar o porquê de ter sido atacada e se o que está acontecendo com os parasitas X é verdade ou não.

A partir daí o jogo lhe apresenta a forma original de um jogo Metroid 2D. Sim, você deverá explorar níveis e ficar empacada neles; sim, a sua exploração em determinado momento do jogo revelará um labirinto ainda mais elaborado e complicado; sim, você encontrará upgrades para permitir avançar nos mapas; sim, a mecânica de movimento e combate fazem com que isso seja divertido; sim, você irá encontrar chefes elaborados com batalhas memoráveis. E sim, aqui o equilíbrio entre “risco” e “recompensa” nunca foi tão deleitoso.

Isso porque, primeiramente, o que funciona bem em Metroid Dread é justamente como o jogo sabe o que manter de sua forma clássica e o que mudar para melhor. Obviamente, de 2002 para cá, a principal mudança esperada seria nos gráficos, que não decepcionam.

O principal destaque está na deliciosa mistura entre iluminação e a ambientação dos cenários, que variam entre um pseudoinferno banhado por lava, um palácio portentoso e ornamentado de uma raça primordial, até uma estação cercada por ondas enormes e uma incessante chuva. Isso é melhorado inclusive com a adição do nível de detalhes de Samus e interação da personagem com os cenários — como por exemplo, apoiando a mão acima de uma fresta para observar o outro lado, ou até em frente a uma porta fechada. O que torna aquele mundo ainda mais rico.

Outra adição relevante orbita na sensação do jogo. Tanto digital, quanto real. Explico. Além da jogabilidade ser precisa, a inércia da personagem fazer sentido, é também perceptível como há uma progressão de poderes do personagem principal. Sentir meu bichinho ficar mais forte a cada vez que eu entro no jogo? É por isso que eu jogo videogame! Voltando… Essa precisão de movimentos de Samus, que se tornam mais intricados conforme há progressão, transforma a tarefa que seria mais “chata” naquela ambientação em simplesmente divertida.

Além disso, a sensação dos controles é aprimorada ainda mais com a vibração HD dos controles do Switch. É muito raro destacar essa função, que tornou-se quase ofuscada após, por exemplo, o PlayStation 5 vir com uma mecânica de vibração tátil. Acontece que em Dread tudo parece muito preciso. É possível sentir, de fato, quando Samus pisa em uma plataforma de checkpoint, abre uma porta com um tiro, ou a intensidade dos golpes de um chefão.

Falando em chefões, não chega a ser uma surpresa observar que as batalhas de chefes em Dread sejam divertidíssimas e ainda mais desafiadoras. É aqui que a filosofia do risco e recompensa coloca o jogador em teste e se consolida ainda mais como seu principal chamativo. O risco, por conta das mecânicas elaboradas — ainda que não muito complicadas — mas inteligentes inclusas nesses confrontos, o que torna todo o conjunto mais proveitoso. A recompensa, bem. Quem não ama buscar os upgrades num metroidvania…. Desculpe. Num Metroid e ponto.

Além disso, outras surpresas positivas são mostradas no decorrer do jogo. A que mais chama atenção é que em Dread as cenas cinemáticas (cutscenes) não são pré-renderizadas, mas sim renderizadas dentro do jogo. Os desenvolvedores tiram proveito disso quando, por exemplo, Samus consegue dar parry em um inimigo e cortar para uma cena em que ela consegue desferir um ataque mais poderoso, gerando momentos memoráveis — incluindo nas passagens dos chefes.

É curioso também como a equipe da MercurySteam conseguiu incluir elementos de furtividade (stealth) em partes do jogo. O planeta que Samus está explorando é guardado por robôs sentinela E.M.M.I.S que, segundo o próprio jogo, praticamente não podem ser derrotados. Assim, o jogador precisa atravessar as áreas confusas com essa precaução em mente. Felizmente em determinado momento do jogo esse incômodo acaba, mas é curioso e uma mudança de ritmo bem-vinda para a experiência.

A única manutenção que considero negativa, neste caso, é de como em momentos quando você já está num nível avançado no jogo, com áreas enormes exploradas, é quase contra-intuitivo navegar pelos cenários. Principalmente os iniciais. Por mais que a premissa de um jogo dessa espécie seja explorar tudo umas 3, 4 vezes, há um limite. E esse limite, a paciência do jogador, também é um elemento que deve ser incluído na equação do game design.

Ainda que em 2017, com Samus Returns para 3DS, tenhamos tido uma noção do que seria um Metroid 2D hoje em dia, Dread parece ser a experiência definitiva e completa para a série neste aspecto. Sim, Metroid Dread é um jogo magnífico justamente por saber o que manter — com apenas uma ressalva — e o que melhorar. E sim, agora eu entendo os fãs da série. Agora vamos xingar muito no Twitter juntos.

Álvaro Viana

Jornalista político, tem 30 anos, apaixonado pelo mundo dos games, cinema, e o ofício de analisar esses temas de forma criativa. Trabalhou com análise de jogos para o jornal Correio Braziliense e outras publicações e edita tudo que você lê neste site. Quando sobra tempo cura memes, reclama no tuiter, e testa novos templates pra loady!

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