Ignorado pelos grandes festivais, relativamente esquecido pelo público, mas aclamado pela crítica, Sempre em frente, C’mon C’mon (2022) é um filme que conecta tanto com o espectador, que nenhuma dessas frivolidades da indústria parece importar muito.
A premissa é das mais simples: Johnny, um radialista interpretado por um acolhedor Joaquin Phoenix, roda o país entrevistando crianças sobre o que pensam sobre o presente e o futuro delas mesmas e do mundo. No meio do caminho, uma emergência familiar faz com que ele precise cuidar do sobrinho de oito anos, Jesse (Woody Norman).
Interessante que, aqui, o óbvio não se confirma. A salvação do adulto cínico - escolha óbvia - é substituída por uma relação de amizade e resgate de uma certa inocência, contrastada com longos (e bem feitos) diálogos e visões duramente sinceras das crianças entrevistadas. Tudo em preto e branco, o que só amplia a sensação de nostalgia e calor humano.
Se temos essa sensação ao assistir o longa, é mérito do diretor Mike Mills, que traduziu muito bem seu objetivo à mídia norte-americana.
Além fazer referências ao desaparecimento da criança interna de cada um à medida que passam-se os anos - daí, o personagem de Jesse, suprindo este papel -, Mills afirmou que filmar em preto e branco, para ele, teve o propósito de tornar o filme “uma memória compartilhada”.
E o filme tem êxito ao apresentar essa proposta.
Para sempre rádio
Fim da inocência, crescimento, medo do futuro. São temas recorrentes de diversas obras, especialmente os chamados coming of age (filmes sobre amadurecimento), mas que, novamente, Mills consegue ultrapassar qualquer rótulo.
Em dado momento, Johnny e Jesse estão em Nova York, gravando os sons ambientes da cidade, o adulto fala: “São sons tão bonitos. Ao gravarmos, os eternizamos”.
A síntese do personagem de Phoenix cai como uma luva dentro da delicadeza do filme. Afinal, se a "perda" da inocência é inevitável com a passagem para a vida adulta, as entrevistas feitas ao longo do filme enternizam o tempo e o momento dessas crianças, que são reais, diga-se de passagem.
Neste momento, o próprio roteiro mostra-se alinhado com a abordagem tomada pela direção. Por que não realizar entrevistas em vídeo, como seria o normal nos tempos de hoje? Por que fazer rádio, essa mídia “obsoleta”?
Talvez porque o rádio seja, ainda hoje, uma das mídias tradicionais mais utilizadas, justamente por dar a sensação de proximidade entre o usuário e o emissor da mensagem.
Ao trazer à tona todos esses elementos, C’mon C’mon é candidato ao panteão dos melhores filmes do ano, por se propor oferecer o básico, e algo do que falta na indústria hoje: empatia e conexão humana.