Entre a grande parte dos problemas imagináveis para um filme de super-heroi, qual você acharia o mais provável? Piadinhas péssimas por conta da falta de timing cômico? Um roteiro fraco por não conseguir decidir por onde encaminhar sua narrativa? Uma trilha sonora genérica? Cenas de ação também genéricas? Ou tudo isso junto? Em Adão Negro há um pouco de tudo isso mencionado acima, mas a parte mais perturbadora é um roteiro burro, assinado por Adam Sztykiel, Sohrab Noshirvani e Rory Haines. Ao que dei o nome de síndrome do roteiro revisionista.
Aqui temos a clássica cena de origem (neste caso, do poder) e, na sequência, o renascimento (no nosso caso, o nascimento) do herói. É desde este momento inicial que se cria uma ideação estúpida pelo roteiro, que não sabe o que quer contar, sobre a aspiração libertária e identitária de um povo de Kahndaq e qual seria o papel dos herois em meio a isso.
Até chegar em um determinado ponto constrangedor em que um garoto, vestido com uma capa que remete nada menos que os Estados Unidos e a OTAN, dá a coragem que faltava àquele povo, fadado pela sua inferioridade de não ter nascido em terra estadunidense.
E como o cinema hollywoodiano nos ensina, quem melhor para salvar um povo do que os EUA?
O problema de Adão Negro é seu péssimo roteiro
No entanto, por incrível que pareça, esse é o menor dos problemas em Adão Negro. Porque como eu disse, o roteiro sofre de uma dificuldade absoluta: a de decidir o que quer contar. E de quando decide, não tem pudor em voltar atrás. Fico curioso para saber o processo criativo deste filme. Deve ser semelhante a quando eu tento desenhar alguma coisa.
Por conta disso, é necessário avisar aqui que, a partir deste ponto, a crítica terá spoilers. Veja abaixo dno último parágrafo.
SPOILERS
O primeiro ponto em que o roteiro dá uma informação ao espectador e volta atrás, é o mais compreensível, e claramente pode ser uma ferramenta narrativa, como a é em várias outras metragens. Falo sobre o momento em que o espectador descobre que aquela história de origem não era sobre Teth-Adam, e sim sobre seu filho, o que apenas surge como um apelo emocional forçado do meio para o final do filme, sem nenhuma construção cabível ou crível até este ponto. Mas vamos lá, temos por relevar este primeiro, ainda existem outros pontos ainda piores.
Durante uma boa parcela do filme uma frase genérica é entoada por vários personagens. Ela remete a 5 mil anos atrás e à coroa de Sabbac que dá poderes ao seu portador. Diz-se que “a vida é o caminho para a morte” a inscrição dentro do ornamento.
O que não fazia sentido nenhum no contexto da metragem. Em determinado momento — o mais conveniente, claro — o roteiro muda a frase para “a morte é o caminho para a vida”, e continua não fazendo sentido nenhum. O único sentido é o de ter sido uma péssima ferramenta para explicar como o vilão do filme ganharia seus poderes no terço final do filme.
Porém o momento mais simbólico do “revisionismo” no texto de Adão Negro é uma passagem em que fica clara a falta de tato com o ritmo do filme. Quando o filme parece ter resolvido o destino do personagem, e a cena se encaminha para o final, decidem “por que não mais 20 minutos de filme?”, e cria-se, baseado em um revisionismo escrachado de um roteiro indeciso, a base para todas essas decisões bizarras. O que resulta em um dos piores textos que já vi em um filme de super-heroi. E para melhorar, tem piadinhas!
Fora isso, as cenas de ação são bem produzidas, principalmente por conta dos efeitos visuais. Destaque muito forte para os efeitos visuais agradabilíssimos da magia de Doutor Destino. E principalmente para Pierce Brosnan. Por ter que ficar carregando o capacete do personagem durante o filme inteiro...
Observa-se em Adão Negro uma junção do que, para mim, é quase um emblema dos filmes com Dwayne “The Rock” Johnson. Um pipocão que, se você se preocupa minimamente com buscar algum sentido na narrativa, uma boa atuação, ou algo que o valha, sairá naturalmente frustrado. Acredito que esses filmes são feitos só para The Rock assistir enquanto estiver malhando ou algo assim. Adão Negro foi tão ruim como esta piada.