NOTÍCIAS

Madres paralelas: Almodóvar erra, o que é muito bom

Dá uma certa paz no coração ao notar que boa parte da filmografia do espanhol Pedro Almodóvar está disponível hoje nas principais plataformas digitais, como Prime Video e agora a Netflix.

Em tempos de hiperenlatados, debacle das mais importantes premiações, e uma aparente homogeneização do cinema comercial, nada mais alentador que ter a oportunidade de conhecer a obra de um dos mais importantes cineastas das últimas décadas.

Madres paralelas (2022), o mais novo melodrama do diretor, é um exemplo da necessidade de abrir-se novamente os leques do cinema a um grande público, justamente por ser uma daquelas obras que você pode até não gostar, mas jamais sairá incólume da sessão. Só por isso, o novo longa de Almodóvar já tem um ponto positivo. 

Colaboradora de longa data, Penélope Cruz interpreta Janis, uma mulher forte em busca de resgatar a memória dos homens de sua família, vítimas da guerra civil espanhola que deu vida ao franquismo. 

A veia política, que serve de motivo para contar a história de mulheres que herdaram de suas mães e avós o ônus da maternidade solitária, é o grande trunfo do novo filme do cineasta. 

Não se engane: Almodóvar nos dá um pastiche de Almodóvar, mas a conexão que faz entre a política e a trama principal de Janis torna-se uma forma inteligente e emocional para desenvolver um roteiro que se baseia, principalmente, na memória.

Como se trata de um cineasta com assinatura, isto é, com características bem definidas que inevitavelmente se repetirão ao longo de sua obra, essa novidade trazida por Madres paralelas nos ajuda a ter, ao mesmo tempo, um senso de novidade em um diretor que não economiza no drama.  

Ponto alto

Apesar do sopro de ar fresco no longo, em comparação às obras anteriores, é a atuação de Penélope Cruz que impressiona. Indicada ao Oscar pelo papel, aqui a atriz está a mil tons abaixo que o costume.

Talvez pela trama ser centrada em mães solteiras, a sobriedade na atuação de Penélope é uma boa surpresa no filme. Sua parceira de tela, Ana (Milena Smit), vai na direção contrária: é uma jovem inexperiente e assustada com a responsabilidade de criar um recém-nascido.

No filme, o encontro das duas mulheres, que se conhecem prestes a darem parto, é o grande apelo do filme, o que deixa aquele sopro de ar fresco - a veia política - um tanto quanto apagada e, por vezes, desnecessária. 

Tédio

Mais uma vez indo contra o grande consenso da crítica, tive dificuldades em avançar em Madres paralelas. Não sou grande conhecedor da obra de Almodóvar, mas já me comovi mais com filmes pregressos do diretor espanhol, que são - em sua maioria - muito mais melodramáticos que o novo longa.

Ao final do filme, Almodóvar faz uma forma de statement contra o passado ditatorial da Espanha, e o negacionismo do presente que teima em apagar histórias traumáticas.

Se esse é o statement do diretor, é inevitável desvencilhar da impressão que ele não conseguiu pronunciar sua mensagem de forma adequada ao longo do filme, tampouco a trama principal centrada nas duas mulheres.


Embora o filme traga novidades e boas percepções, o sentimento que fica é de duas mensagens que, embora conectadas, não se comunicam com eficiência. De toda forma, em um mar de mediocridade, é sempre bom sermos lembrados que o bom cinema é aquele que, ao tomar riscos criativos, está sujeito ao fracasso - como é o caso na vida real.

Postagem Anterior Próxima Postagem

Formulário de contato