Considero uma riqueza a forma como Larraín mostra controle e precisão -determinantes para que essa noção seja passada de forma sutil e bela- sem apelar a escolhas estilísticas totalmente escancaradas. Tais como o uso de movimentos precisos e enquadramentos simétricos para retratar a exatidão quase militar dos membros e da equipe real e o uso de ‘câmera de mão’ e enquadramentos não tão obsessivos para retratar o desajuste e o deslocamento psíquico de Diana.
Aqui, por exemplo, sua escolha pelo aspecto de tela 1:66:1 parece encaixar perfeitamente ao objetivo de tornar o incômodo um quase personagem de sua história, seja nas representações de Diana em meio aos cenários quase obsessores da mansão real ou, principalmente, como permite o uso de planos fechados mais expressivos auxiliados pela excelente presença de Kristen Stewart.
Mesmo sendo elementos quase figurativos a Diana, são também complementares em como fazem ressoar o estado psicológico da protagonista. A estilização das cores — menos saturadas — ou a trilha sonora contribuem para que haja um incômodo natural e uma sensação que beira a sobrecarga, quase transferida ao espectador. Interessante, ainda é como por momentos a trilha sonora lembra muito músicas que estimulam uma certa ansiedade que precedem momentos tensos nas trilhas do “pós-horror”.
Há essa noção de um foco no desconforto em como o diretor também opta por uma certa ‘textura’ na imagem do filme; um “ruído” leve mas perceptível e como o descarte dessa perspectiva é mudado perto do fim da rodagem.
Apesar de contribuírem para imprimir essa noção de um pseudo neothriller ambientado na mansão real, a despeito da ameaça vindo de cenários ou de terceiros, como é habitual no gênero do terror, o que mais fragiliza Diana naquele contexto e àquela altura já são suas próprias convicções e complexos que flertam com a esquizofrenia. Momentos como o primeiro jantar da noite de natal quase repelem o espectador e apesar de bem executados acabam sendo um desafio de assistir para pessoas naturalmente ansiosas como eu. O que não retira o mérito para a construção de uma personagem tão interessante.
O que, ao meu ver, permite que tudo isso torne-se unidade sólida é a forma natural como o roteiro de Steven Knight atravessa os três dias em que Diana passa o natal com a família real. Os diálogos muito naturais permitem o uso de metáforas com elementos daquele mundo, como a jaqueta do pai da protagonista, as cortinas, e por aí vai.
Por mais que observemos a dificuldade da personagem em meio àquela ambientação opressora, o que mais ecoa na experiência acaba sendo a forma como Kristen Stewart passa o reflexo do que está ocorrendo.
O que certamente une todos esses elementos em uma experiência proveitosa está na forma como Stewart cria uma personagem naturalmente carismática, bela e uma sutileza que não se apoia só nos trejeitos mas também em uma fragilidade constante. Novamente, acredito que a cena do jantar de pérolas é uma das minhas sequências preferidas até este momento no ano. E muito disso se dá por como Stewart quase me fez quase ter uma crise de pânico junto a ela.
Spencer é tecnicamente impecável, e por mais que o seja, alguns momentos seu foco pelo incômodo quase exaustam o espectador. Mas acima de tudo isso, é uma construção muito precisa sobre a complexidade do momento de uma personagem apoiada por essa precisão técnica tanto no estilo quanto em uma atuação primorosa. Tomara que um dia Pablo Larraín faça um filme sobre a minha vida. Estou disponível.