NOTÍCIAS

King Richard: e as sucessoras?

Eu me recuso a imaginar qualquer alma viva em Hollywood que dê um pep talk (discurso motivador) tão bem quanto Will Smith em seus personagens! Em King Richard - criando campeãs, felizmente, a história não só se repete como toma novos ares, com mais uma atuação tocante, porém não destoante de uma metragem tecnicamente atrativa e que, acima de tudo, conta uma agradável história através de uma jornada pela mente e vida de um personagem curioso.

Nesta metragem que conta parte da história de como a família Williams construiu a base para lançar duas das mais lendárias jogadoras de tênis ao mundo é perceptível também uma certa preocupação com a sutileza. Naturalmente, neste cenário, Smith é o condutor de um roteiro sóbrio e objetivo, que inclui seus personagens em interessantes abordagens, quase sempre com um tom leve — e desprovido de uma moral chapa-branca visível, o que poderia ser uma tentação da produção— mas não menos importantes. 

Neste cenário, passagens como um diálogo entre Richard e Oracene (Aunjanue Ellis) sobre o talento e o futuro das filhas perante à rotina apinhada, e ao fundo, todas as cinco irmãs cantando em um show de talentos improvisado, ditam um ritmo agradável que se mantém até os momentos finais. Muito pela interação dos personagens, mas também por como o filme aborda com a mesma astúcia os desafios, dentro e fora de casa, de educar as filhas em um ambiente acolhedor. Não seria exagero dizer, no entanto, que em momentos a construção de Richard pode pintar um pai de família de comercial de margarina.

A metragem mostra assim as implicações das escolhas de Richard nas filhas e pessoas próximas. Ainda que isso ocorra, a quantidade de conflitos dessa natureza existentes no filme é bem reduzida, aspecto que enriqueceria ainda mais a experiência e a compreensão daquele personagem. Para efeito comparatório, é como se Coach Carter tivesse mais um filho e não treinasse basquete, e sim golfe. Mas em Carter há um desenvolvimento de um personagem mais crível.

Felizmente também é perceptível a escolha do diretor Reinaldo Marcus Green pela filmagem de câmera à mão nos momentos iniciais para mudar por filmagens mais fixas a partir da segunda metade, o que contribui para a compreensão daquela atmosfera que vemos também pela história, em um momento mais equilibrado, estável, e por aí vai. Esse dedo do diretor aponta também para uma cinematografia bela - principalmente nos takes muito criativos dentro da quadra de tênis, no terço inicial da rodagem.

Não é só Smith que brilha aqui com seu carisma e um timing cômico genuíno. Aunjanue consegue exibir uma força quase ameaçadora e materna em seu retrato de Brandy Williams e isso fica evidente nos conflitos entre ela e Richard. Veja, na minha experiência eu gostei até do retrato de Rick Macci feito pelo Jon Bernthal.

Não deixa de ser surpreendente que a metragem, no entanto, romantize o personagem através de apenas uma parte — obviamente — relevante de sua vida. Mas ainda assim, uma parte. Está implícito o pressuposto de que vemos este filme através da lente do sucesso de Serena e Venus Williams. Isso é evidente pela escolha de como a história é conduzida até a forma como os personagens foram estruturados.

É também óbvio que passamos a ver a partir dessa ótica quando nota-se que as mesmas irmãs também assinam a produção do filme. É a ambiguidade do cinema. Talvez seria tão ou mais interessante observar essa figura através de todos os outros ‘sucessores’ do rei Richard.

Postagem Anterior Próxima Postagem

Formulário de contato