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Em Maligno, Wan troca qualidade por amontoado de referências

Poucas são as pessoas que chegam neste mundo e conseguem mudar o estado das coisas como elas são.

O cineasta James Wan é uma dessas pessoas, e conseguiu o feito de ditar tendências no cinema de horror em um espaço curtíssimo de tempo e com uma sequência impressionante de sucessos.

De “Jogos Mortais” (2004) ao arrasa quarteirões “Invocaverso”, Wan tornou-se um vanguardista em seu segmento, mostrando que é possível fazer terror de qualidade, mesmo apoiado nas costas de um grande estúdio.

Para além da destreza em lidar com todos os subgêneros do horror, o cineasta sabe como cativar o telespectador por meio de personagens fortes e histórias convincentes, o que permite a criação de uma forte conexão emocional com o público.

E essa conexão é justamente o diferencial de Wan, em meio a um gênero de filmes que por vezes soa datado ou previsível. Sua direção costuma levar os filmes para além das fronteiras de gênero, como ele próprio afirma.

“Eu acho que criar personagens que as pessoas se importem é a coisa mais importante, não importa o gênero de cinema […] Esse é meu objetivo”, disse Wan, em 2016, na divulgação de “Invocação do Mal 2”.

Não dá pra abraçar o mundo

Em “Invocação do Mal” (2013), vemos isso. Altamente elogiado pela crítica e um sucesso de bilheteria, credenciou de vez Wan aos estúdios como um diretor de risco aceitável. Foi o que o levou a dirigir filmes como Velozes e Furiosos 7 (2015) e Aquaman (2018), por exemplo.

Bilhões de dólares depois, chegamos a Maligno (2021), lançado nos últimos dias nos cinemas brasileiros. O filme marca não só o retorno de Wan ao terror, como uma aparente mudança na forma com que diretor vinha abordando suas histórias.

Pois, se o objetivo de Wan era criar histórias aterrorizantes, mas com grande apelo emocional por meio de personagens bem construídos, em “Maligno” ele errou. Ou, ao menos, mudou sua meta.

Nos 111 minutos de filme — que parecem durar o dobro em tédio e previsibilidade — não há nada que sobreviva além de um pot-pourri mal conduzido de referências de todos os gêneros do horror: dos terrores italianos aos slashers, passando por suspense policial e ação explosiva.

Tudo isso, contudo, com ares de novela mexicana.

Ao mirar em todas essas referências — levando até a alguns bons momentos — Wan acaba por não desenvolver nenhuma delas de forma satisfatória. A impressão é de um filme feito por um diretor experiente, mas que não soube usar o cheque em branco que recebeu — este, assinado pelos parceiros de longa data da Warner.

Cheque em branco

Não é possível, se formos ser sinceros, criar qualquer tipo de apego diante da história de Madison Mitchell (Annabelle Wallis), mulher que vive um relacionamento abusivo e que começa a ter visões de assassinatos reais. Ou sofrer qualquer tipo de choque real pelas ações de Gabriel, aberração de seu passado que a assombra.

Os plot twists, por exemplo, poderiam abrir boas possibilidades no longa, mas acabam por não compensar o emaranhado de diálogos sofríveis e clichês subaproveitados. Aqui, as cenas gore e o teor sci-fi da trama parecem gratuitos, e não oferecem nada além de bocejos.

Assim, Maligno parece a obra de um cineasta que perdeu-se em sua própria ambição. Um falso manifesto de ousadia, que usa de múltiplos recursos para esconder o que fica claro no final: uma história que ninguém vai se importar daqui a seis meses.

Por Nestor Rabello

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