O tão aguardado momento dentro de um segmento absoluto no mundo dos games chegou esta semana com a entrada dos consoles da nova geração no mercado brasileiro. O que ainda é um privilégio de parcela seleta da população tupiniquim - esta qual, inclusive, pagará o segundo PS5 mais caro do mundo - também não deixa de ser determinante indicativo para a discussão de em que pé anda a indústria de games e, neste caso, o que poderá mudar daqui pra frente? Questionamento inseparável do anterior.
Já adianto: basicamente nada. E explico.
Para a nova leva de consoles caseiros a Sony e a Microsoft, de certa forma, abraçaram o que passou a ser encarado como o estigma dos consoles, aparelhos que já saíam ultrapassados das prateleiras em comparação aos PCs - principalmente de duas gerações passadas para cá. Com isso, o holofote no PlayStation 5 e do Xbox Series X focou em mais aspectos técnicos e inovações consideravelmente recentes no mundo tecnológico, como a implementação de um recipiente de armazenamento de disco sólido (SSD) e a possibilidade de acatar a tecnologia RayTracing (renderização dinâmica de luzes).
As companhias decidiram ainda por componentes turbinados focados para maior desempenho gráfico, o que levou o público dos consoles mais próximo aos “pc gamers”, ao definir como fator vendável a capacidade de alguns jogos rodarem em 4K e 60 fps. Algo que, há 4 anos atrás, seria inimaginável. É neste sentido que argumento a aceitação por parte de Sony e Microsoft de que os consoles, de fato, sempre foram tecnologicamente inferiores.
No entanto ambos os trombolhos que já estão chegando ao público brasileiro apresentam suas particularidades. Enquanto o PlayStation 5 se calcará em um sensor háptico (tátil) no controle para possibilitar uma “maior imersão” com o universo do jogo, o Series X tem como principal aspecto particular a tecnologia Quick Resume, que te permite deixar de três a quatro jogos “minimizados” em segundo plano, para, como diz o nome, resumir rapidamente a sessão.
Ao começar a observar essas inovações sendo cada vez mais concretizadas eu não conseguia dissociar o ângulo de observação sobre uma questão que acredito ser fundamental. Tudo isso invariavelmente suscita o questionamento de como acompanhamos jogos. Neste âmbito o surgimento de indagações como se melhoria gráfica seria proporcional à melhoria de um jogo no geral ou se imersão não é um conceito abstrato demais seria natural.
Ao tempo em que essas características foram sendo anunciadas uma segunda discussão na indústria era desenrolada, sem muita atenção. Ou melhor, sem a atenção devida. Após um pronunciamento de um representante da 2K, de que a nova versão do NBA 2K21 passaria a custar U$ 70 em contrapartida aos “normais” U$ 60 da geração passada, gerou-se um burburinho e logo o questionamento se as empresas acompanhariam essa toada ou não. Pois bem. Obviamente sim.
Em diversas ocasiões representantes de variadas empresas deram a entender que a nova determinação seria acatada e o consumidor se mostrou absolutamente tranquilo com relação à mudança. Não é surpresa, pois, quando nos deparamos com a PlayStation Brasil ainda hoje aumentando preço de jogos na PSN brasileira do dia pra noite ou limitando a compra de um jogo em promoção a versões deluxe que custam 50% a mais. Sem meias palavras, o famoso descontinho brasileiro de Black Friday, com a simples mudança de haver um ‘deluxe’ no nome.
Exclui-se ainda o fato de que, durante o período da pandemia, a receita bruta da indústria foi de U$ 159 bilhões, um aumento de 9,3% em relação ao mesmo período de 2019. E grande parte dessa alavancada deu-se num momento onde discute-se o ambiente de trabalho das companhias e os diversos relatos que apontam a prática de crunch em desenvolvedoras.
Algo que dificulta essa percepção dentro do mercado nacional dá-se, além de uma absoluta chuva de chorume populista visando abocanhar parte de um eleitorado perdido, por uma composição tributária absolutamente complexa onde, nenhum cidadão que não tenha passado 52 anos em uma faculdade de Economia - o que não confirmaria nada - consegue entender o que incide sobre o preço de jogos e consoles no território nacional de forma detalhada.
Ao tempo em que isso ocorre principalmente no que se refere à cobertura de games brasileira não há alguém que busque uma explicação com algum representante das marcas ou mesmo buscam reportagens com ângulos mais investigativos. O que ocorre, no entanto, é uma enorme suruba de assessoria de imprensa com veículos “jornalísticos” brasileiros, que funcionam quase como anúncios pagos da nova geração e de novos jogos. A grande parte muito bem fantasiada com espalhafatosos contratos de embargo para ornamentar a cabeça do jornalista gamer ou viagens pagas.
Naturalmente o início de uma nova geração claramente reforça aquele quase ancião questionamento sobre como consumimos jogos. E quase sempre isso é visto da forma que requer menos esforço. Discutir a arte, a jogabilidade, os 60 frames por segundo e os 4K é lindo. Maravilhoso. Seria ainda mais se pudéssemos voltar a observar como consumimos jogos.
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