NOTÍCIAS

Paper Mario é um jogo ideal para a quarentena... não que isso seja bom


Paper Mario: The Origami King é o jogo perfeito para ser jogado nesta quarentena. O que não necessariamente o faz merecedor de elogios por suas virtudes; elas aparecem, mas não são de longe o que chama atenção para si, estatizadas por um combate no mínimo peculiar. Por outro lado, os elementos positivos que vão do excelente design até um texto delicioso - e  a possibilidade de aproveitar isso - destoam do período sombrio no qual estamos presos na realidade.

A história rasa de Paper Mario, costumeira na série desde sua a versão para Wii, apresenta o antagonista rei Olly, que tem como motivação alterar o universo para seu feitio, sendo este dobrar as figuras de papel presentes ali em forma de origami a fim de ter controle sobre elas.  Em paralelo, a irmã do vilão, Olivia, torna-se a parceira de jornada de Mario visando deter o irmão que está destruindo aquele universo. 

Estabelecida essa temática o título cria sistemas que orbitam em torno da estética da arte tradicional japonesa do origami. Essa definição evidencia que as mecânicas e escolhas estéticas presentes em Origami King são remanescentes dos jogos anteriores da série. Sticker Star, do 3DS e Color Splash, do Wii U, fizeram o mesmo. Com a diferença da estética. Uns centravam-se nos adesivos e cores, enquanto o outro centra-se nos origamis.

Sendo mais específico: a mecânica que lhe permite consertar parte do cenário que está incompleto com papeis acontece quase que da mesma forma em Color Splash, em que você pode “colorir” as partes acinzentadas do cenário. Ou em Sticker Star, onde os adesivos fazem a vez. 

Outro exemplo é a estrutura narrativa da série, que parece ser sempre reciclada de um jogo para outro. Enquanto no título de 2020 nos vemos em frente a um megalomaníaco que transforma criaturas em origami, no de 2016 (Color Splash) nos vemos em frente a um megalomaníaco que furta a cor daquele universo. 

Enquanto em 2020 temos um parceiro de jornada que nos permite utilizar a mecânica dos origamis na jogabilidade, em 2016 tivemos um parceiro de jornada que nos permitiu utilizar a mecânica das cores na jogabilidade.

As repetições, todavia, não são de todo o ruim. O agradável e bem humorado texto de Paper Mario é o principal trilho guia de sua narrativa, que por mais simples que seja, ganha um dinamismo e humor louvável. E isso também foi trazido dos títulos anteriores.

Não é raro esboçar um sorrizinho ou até mesmo dar uma gargalhada ao ver o que os clássicos personagens da série de games mais famosa da história têm a dizer. Ou até em outras situações, como a sequência musical das árvores, ainda no primeiro setor do jogo. Ao longo do tempo em que joguei Origami King, registrei alguns exemplos desse texto bem escrito. Se liga na galeria abaixo!

Combate e controvérsia

Eu me apaixonei pelo combate de Paper Mario até a primeira metade do jogo. De uma hora pra outra, acredito que quando o raciocínio acerca da falta de motivação e progressão para aquelas batalhas me veio à mente, foi quando passei a desgostar dele. Nesse interim, lembrei-me de que ao longo das últimas semanas o produtor da série, Kensuke Tanabe, deu uma entrevista que gerou um burburinho por falar desse sistema. Então fui ver.

Na ocasião Tanabe afirmou à publicação alemã PCGames que “o esforço para encontrar sistemas novos e inovadores é a base da filosofia que minha equipe e eu estamos seguindo ao desenvolver jogos. Como tal, acho que é uma necessidade que o sistema de combate mude em cada jogo”. Essa afirmação colocou uma pulga atrás da minha orelha. Após raciocinar sobre, tenho certeza de que é porque é só uma desculpa maltrapilha que pode ser destruída em um parágrafo. 

Como já dito nos parágrafos anteriores, algo que não há -de longe- em Paper Mario é a presença de “sistemas novos e inovadores”. A estética, a estrutura narrativa, os próprios sistemas de exploração e conserto dos cenários, até mesmo o combate - que tem vestimenta nova, mas o corpo é o mesmo - e a presença dos diálogos engraçados. Tudo isso está presente no jogo há, pelo menos, 8 anos. É por isso que entrevista com produtores da indústria me irritam tanto. Metade do que eles falam é regurgito achando que o público é burro e vai engolir. 

Eu entendo, no entanto, por que Tanabe acredita que o combate presente no mais novo jogo da franquia seja “inovador”. Como já dito, é uma vestimenta nova, é ordinal, e não passa disso. E talvez aí o cara tenha se confundido em sua argumentação. Ao contrário do jogo anterior, que permite o uso de cartas para ataques, aqui, o sistema de combate funciona mais como um puzzle. Uma mudança que não é estruturante, e sim ordinária. 


Os inimigos de Mario são posicionados em cima de vários anéis concêntricos, e o bigodudo fica no meio. Durante a primeira fase de cada batalha, Mario pode girar ou deslizar ao redor dos blocos que compõem estes anéis para alinhar seus inimigos. Assim, você manipula seus inimigos para agrupá-los, o que os torna mais fáceis de limpar. Nessa imagem ao lado dá pra ter uma ideia melhor.

Após isso, o combate é exatamente o que era desde o jogo de Wii, baseado em turno e no seu timing na hora dos ataques. O único brilho desse combate se dá durante as lutas com os chefes, que aparecem com escassez e servem mais para ofuscar as batalhas normais do que animar o jogador. Nelas, a mecânica do posicionamento do personagem é levada em conta, diferentemente das lutas normais, o que deixa mais divertido.

Porém, o aspecto fulcral para o infortúnio do sistema de combate de Paper Mario é a sua falta de motivação e progressão. Além de funcionar como um obstáculo para ser ultrapassado na exploração dos cenários não existe nenhum outro encorajamento para lutar com os inimigos. Em relação ao progresso, há uma limitadíssima possibilidade de itens que podem ser usadas em combate. 

Salvo esses aspectos, fora de combate, Paper Mario é um deleite de se explorar. A interação com o cenário, por exemplo, sempre convida o jogador a explorar de forma orgânica, com sempre um segredo a ser descoberto - a maior parte deles, Toads que foram transformados em elementos do cenário como flores, borboletas, sapos...

Aliada a isso a exploração é recheada daqueles momentos satisfatórios e mínimos presentes em alguns jogos da Nintendo, como o simples ato de bater o martelo e a vibração muito precisa do controle em resposta às ações. Com isso, as mini recompensas em Origami King constroem-se literalmente nos detalhes. Mais alguns: a câmera lenta ao bater o martelo em um dos Toads escondidos, os próprios cenários, que são lindos; o humor mostrado no texto e o clássico ato de coletar moedas.

Esses detalhes proveitosos e mínimos, junto à ambientação colorida e bem humorada são boas contraposições a todos esses elementos da realidade na qual vivemos, onde os mínimos detalhes de atos humanos parecem mais escassos e a eclosão da ruindade parece ter corroído a camada social e criado um filtro cinzento sobre nossa própria existência. Por esses motivos Paper Mario parece ser perfeito para ser jogado no momento atual, a fim de distrair-nos de tudo isso. A esperança que fica é a do dia que o consideraremos apenas um jogo fraco.

Álvaro Viana

Jornalista político, tem 30 anos, apaixonado pelo mundo dos games, cinema, e o ofício de analisar esses temas de forma criativa. Trabalhou com análise de jogos para o jornal Correio Braziliense e outras publicações e edita tudo que você lê neste site. Quando sobra tempo cura memes, reclama no tuiter, e testa novos templates pra loady!

Postagem Anterior Próxima Postagem

Formulário de contato